

Vírus gigantes desempenham um papel crucial nas complexas teias alimentares (também chamadas de cadeias alimentares) que caracterizam os ecossistemas aquáticos. Esses microrganismos infectam organismos unicelulares, como algas, amebas e flagelados, essenciais aos ciclos alimentares marinhos. Ao penetrar no DNA da célula do organismo infectado, o vírus altera seu metabolismo e, assim, influencia fenômenos que afetam o equilíbrio ecológico, como o crescimento excessivo de algas.
As amebas são caracterizadas pela formação de pseudópodes (pernas falsas) para locomoção e captura de alimento. Os flagelados se movem graças a um ou mais flagelos (apêndices móveis em forma de chicote). As algas, por outro lado, são autotróficas, o que significa que produzem seu próprio alimento por meio da fotossíntese. E os vírus gigantes não são como os vírus típicos que estamos acostumados a ver: são vírus muito grandes, alguns dos quais são maiores do que as bactérias típicas. Eles são conhecidos como vírus de DNA nucleocitoplasmático grande ou NCLDVs (Nucleocytoviricota). Como algas, amebas e flagelados estão na base da teia alimentar oceânica, os vírus gigantes podem desempenhar um papel importante na formação de ecossistemas inteiros.
Em alguns casos, vírus gigantes contribuem para a proliferação de algas nocivas, um fenômeno conhecido como “bloom“, que pode tornar a água tóxica, matar peixes e até mesmo representar riscos à saúde humana.
Um avanço na ciência ambiental e na biotecnologia
Um novo estudo abriu as portas para uma dimensão até então desconhecida da pesquisa marinha: vírus gigantes e seu impacto em ecossistemas invisíveis. Esse conhecimento revolucionário permite que autoridades locais tomem decisões informadas sobre a qualidade da água, a presença de patógenos (algo que causa doenças) e os riscos ecológicos associados. Além disso, promete amplas aplicações em tecnologias de monitoramento ambiental e modelos climáticos preditivos. Este trabalho não apenas destaca a importância dos oceanos como fonte de vida, mas também como um vasto campo de estudo para a ciência moderna. A capacidade dos vírus gigantes de influenciar ecossistemas marinhos sugere que eles podem desempenhar um papel vital na saúde do planeta, uma abordagem que exige um esforço multidisciplinar e global para compreender e proteger esses ambientes.

Benjamin Minch e Mohammad Moniruzzaman, da Escola Rosenstiel de Ciências Marinhas, Atmosféricas e da Terra da Universidade de Miami e autores do estudo, além de descobrirem os 230 novos vírus gigantes, identificaram 530 proteínas virais inéditas. Essas descobertas apresentam imenso potencial para a biotecnologia e a medicina moderna. Neste novo catálogo, algumas proteínas podem ser usadas como enzimas inovadoras para aplicações em biologia molecular, farmacologia ou engenharia genética. Além disso, vírus gigantes podem ser usados como vetores de transferência de genes, contribuindo significativamente para o avanço da pesquisa em genética e bioengenharia.
Essas moléculas abrem possibilidades inimagináveis, afirma Moniruzzaman. “O repertório funcional dos vírus gigantes é mais amplo do que imaginávamos”, disse. Espera-se que muitas dessas proteínas tenham aplicações ainda não descobertas, o que reforça a importância de fomentar a exploração científica nesse campo. Essa descoberta biotecnológica pode marcar o início de uma nova era na medicina e na pesquisa molecular.
Novos horizontes para a ciência
Os resultados também revelam uma desproporção significativa entre o número de genomas bacterianos disponíveis e o número de genomas de vírus marinhos gigantes pesquisados em bases de dados científicas. Embora existam mais de 600.000 genomas bacterianos catalogados, apenas 2.000 genomas de vírus marinhos gigantes foram registrados, destacando o quanto ainda há a ser explorado na ciência do oceano ainda desconhecido. Esse contraste ressalta o desafio e a oportunidade que o estudo de vírus gigantes representa.

Os autores do estudo também desenvolveram o BEREN (sim, como o personagem de ‘O Senhor dos Anéis’), uma nova ferramenta computacional projetada para facilitar a caracterização desses microrganismos misteriosos. Além da publicação de código aberto dos genomas e da própria ferramenta, a comunidade científica internacional agora tem o a recursos fundamentais para impulsionar pesquisas futuras em virologia marinha e bioinformática ambiental. Isso garante que o conhecimento adquirido seja distribuído e utilizado globalmente para gerar um impacto mais significativo na ciência.
A iniciativa de publicar os resultados em artigo aberto representa um compromisso com a ciência colaborativa e o progresso global. Essas investigações não apenas expandem nossa compreensão dos oceanos, mas também transformam a maneira como pensamos sobre sustentabilidade ambiental e possibilidades tecnológicas. À medida que os cientistas exploram ainda mais o papel dos vírus gigantes nos ecossistemas marinhos, é provável que surjam novas aplicações que podem revolucionar setores como biotecnologia, medicina e conservação ambiental.

Este é apenas o começo de um vasto horizonte de possibilidades, onde a ciência oceânica promete mudar nossa percepção dos recursos do mundo natural e sua relevância para o futuro da humanidade.
Referências da notícia
Benjamin Minch, Mohammad Moniruzzaman. BEREN: A bioinformatic tool for recovering Giant viruses, Polinton-like Viruses, and Virophages in metagenomic data. bioRxiv 2024.10.09.617401 (Pre Print).
Benjamin Minch, Mohammad Moniruzzaman. Expansión de la diversidad genómica y funcional de virus gigantes oceánicos globales. npj Viruses , 2025; 3 (1)